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Como as democracias morrem

  • Foto do escritor: levi cezar
    levi cezar
  • 7 de jun. de 2020
  • 4 min de leitura

Existe uma definição bastante interessante do que é democracia: essa definição pressupõe que a democracia é a liberdade da oposição. Quanto mais presente e livre a oposição, mais democrática é uma nação. No entanto, é claro que a democracia não é definida apenas por esse parâmetro; ela também se caracteriza pelo estado de direito, pela presença, liberdade e atividade de uma minoria, e pela soberania do povo.


O Brasil é uma república federativa, o que significa que temos um governo no qual o chefe de Estado (o presidente da República) é escolhido pela população. A federação é a união política de territórios, onde cada estado possui seu próprio governo (prefeito e governador) e uma autonomia própria. O Estado brasileiro adota a tripartição de poderes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.


Diferente de uma monarquia, onde o monarca (rei/rainha) é a figura central que implementa leis, executa e julga, a tripartição de poderes no Brasil visa evitar a concentração de poder em um único indivíduo. O presidente da República, como chefe do Executivo, rege a nação, executando estratégias e conduzindo a diplomacia, mas não tem o poder de criar leis (com exceção de medidas provisórias e outros instrumentos, com prazos limitados). Essa responsabilidade é atribuída ao Poder Legislativo, que inclui vereadores de municípios, deputados estaduais e federais. Embora desenvolvam leis, o Legislativo não pode julgá-las; essa função é do Poder Judiciário, composto por juízes e magistrados. Além disso, há outras instituições independentes dentro da república, como o Ministério Público.


Atualmente, o nosso presidente da República é Jair Messias Bolsonaro, um ex-deputado federal — considerado um parlamentar de baixíssimo clero e descrito como irrelevante. Bolsonaro acumula uma trajetória completamente polêmica, desde seu tempo como militar até a presidência da República, tendo inclusive sido expulso do Exército por terrorismo.


Quando parlamentar, ele sempre foi muito franco em suas declarações — franco até demais, usando palavras de baixo calão e ofensas. Já chegou a dizer que não estupraria uma deputada (Maria do Rosário — PT), por ela não merecer — Como se houvesse parâmetros para um estupro, bem como altura, cor dos olhos ou pele.


Jair Messias Bolsonaro e Maria do Rosário

Um pouco antes de atacar a deputada, Bolsonaro deu uma entrevista no ano de 1999, onde ele defendia não apenas um golpe de estado e o fechamento do congresso, mas também alegou ser favorável a tortura — A entrevista completa pode ser encontrada facilmente na internet. Fazendo um paralelo com alguns anos após, em 2016 quando a até então presidente da república estava em processo de impeachment, o então deputado federal, Jair Messias Bolsonaro, dedicou seu voto à um notório torturador de nossa história, Carlos Alberto Brilhante Ustra. Alguns anos depois desse evento, em 2018, o até então presidenciável foi sabatinado no clássico programa de televisão da Tv cultura, Roda viva. De costume, o âncora do programa fecha a entrevista questionando o entrevistado sobre seu livro favorito, ou “livro de cabeceira”, e Bolsonaro diz que seu livro de cabeceira é “A verdade sufocada” — Livro de autoria de Carlos Alberto Brilhante Ustra. Em 2017 Bolsonaro foi processado por racismo contra a comunidade quilombola. Bolsonaro participou de uma palestra e nela disse que visitou uma aldeia e que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas” — Bolsonaro foi processado e condenado pela 26ª Vara federal do rio a pagar 50 mil reais, porém a decisão foi revertida pelo tribunal regional federal da 2ª região.


Não é uma exclusividade do pai defender abertamente ditaduras ou torturas, mas os seus filhos fazem o mesmo. Eduardo Bolsonaro, em 2018, disse que para fechar o supremo tribunal federal é necessário somente um soldado e um cabo. Já em 2019, Eduardo disse que se a “esquerda radicalizar, a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E essa resposta pode ser via um AI-5”. E em resposta a Eduardo, o general Augusto Heleno (ministro da GSI — Gabinete de Segurança Institucional) disse que se fosse feito um novo AI-5, ele precisaria ser estudado.


Augusto Heleno, Ministro do Gabinete de Segurança Institucional

Essas são apenas algumas das declarações e posicionamentos contundentes desses personagens — uma amostra do que realmente já aconteceu. Em tempos mais recentes, o presidente convoca e apoia manifestações que pedem o fechamento do parlamento e até mesmo do Supremo Tribunal Federal. O maior problema desse processo não são apenas as declarações e posicionamentos autoritários, racistas ou até mesmo nazistas, mas a impunidade com que esses atos são tratados.


Em um dos momentos mais críticos da nossa república — em meio à maior crise sanitária de quase um século e ataques às instituições — temos uma oposição extremamente fraca e desorganizada. A oposição milita intensamente no meio digital e frequentemente emite apenas notas de repúdio. Ela não consegue formar uma maioria sequer para uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o presidente, quanto mais para um impeachment. Até mesmo as instituições independentes têm falhado em cumprir seu papel. No Ministério Público, o procurador-geral da república — que deveria ser um fiscalizador efetivo — tem agido mais como um “passador de pano”, sendo o único que pode abrir um processo de impeachment contra o presidente da república. E, considerando que o presidente violou diversas vezes o Art. 85 da constituição federal,e a lei 1079, Art. 6.


Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I — a existência da União;
II — o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
Procurador-geral da República, Augusto Aras

Esses indivíduos atentam contra os demais poderes e contra outros indivíduos com declarações golpistas e até racistas, alegando que estão exercendo a liberdade de expressão. No entanto, há limites absolutos para tudo, e esses limites são atingidos quando as declarações são golpistas ou racistas. Quando isso acontece, os limites são claramente ultrapassados. Declarações racistas, por exemplo, não são apenas expressões de opinião, mas manifestam racismo sistemático.


Em um dos discursos políticos mais importantes da história da nossa nação, o presidente da constituinte, Ulysses Guimarães, disse sobre a Constituição:


“Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca”


Sim, a democracia brasileira está morrendo, e não é de hoje. Ela falha ao deixar impunes os transgressores, enfraquecendo cada vez mais as instituições.


Ulysses Guimarães

 
 
 

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